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CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL INTERPRETADO

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Jurisreferência

TJRS. Prestação de contas. Art. 914, inc. I do CPC. Interpretação

Data: 06/11/2011

A respeito do dispositivo processual precitado, é oportuno trazer à baila a lição dos insignes juristas WAMBIER, ALMEIDA e TALAMINI (Curso Avançado de Processo Civil, vol. 3, 9ª ed., São Paulo: RT, p. 170), a qual se transcreve a seguir: ... A primeira modalidade de ação de prestação de contas, prevista no art. 914, I, é a daquele que tem o direito de exigi-las. Ou seja, quando houver a obrigação de prestar contas, e o obrigado não prestá-las espontaneamente, terá o titular dos bens esse meio para exigir que as contas sejam prestadas. O procedimento desta ação se divide em duas fases: na primeira, verifica-se a obrigação de prestar contas; na segunda, caso existente a obrigação, analisam-se as contas, em si. ... A petição inicial deverá conter, além dos requisitos do art. 282, a exata menção à origem da obrigação de prestar contas, se legal ou contratual, pois esta será a abrangência da primeira fase. Por isso, deve a inicial ser instruída com a prova de que o réu teve, ou ainda tem, bens do autor em administração.

Íntegra do acórdão

Apelação Cível n. 70035335900, de São Lourenço do Sul.
Relator: Des. Jorge Luiz Lopes do Canto.
Data da decisão: 26.01.2011.

EMENTA: APELAÇÃO CIVEL. DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DE SOCIEDADE. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. PRELIMINAR AFASTADA. SEGUNDA FASE. APURAÇÃO DO SALDO DEVEDOR E DA RESPONSABILIDADE PELA SATISFAÇÃO DESTE. OBJETO DA DISCUSSÃO LIMITADO A FORMA E CONTEÚDO DO CÁLCULO DE LIQUIDAÇÃO. DA PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. 1. O recorrente demonstrou especificamente a sua inconformidade com a decisão, de sorte que há motivação recursal, nos termos do artigo 514, II, do Código de Processo Civil, razão suficiente para afastar a prefacial de não conhecimento. Mérito do recurso em exame 2. Os fatos trazidos à baila pelo demandado nesta segunda fase da ação de prestação de contas deveriam ter sido alegados em sede de defesa na primeira fase daquele procedimento. Entretanto, o demandado reprisa os argumentos constantes na contestação da primeira fase do procedimento, matéria esta que restou irremediavelmente preclusa, a teor do que estabelece o art. 473 do Código de Processo Civil. 3. A ação de prestação de contas é a via processual própria para se aferir a existência de débito ou de crédito, resultante de determinada relação jurídica, sendo necessário que as contas estejam embasadas em documentos idôneos e apresentadas ao Juízo sob a forma contábil, a teor do que estabelecem os artigos 1.020 e 1.183, ambos do Código Civil. 4. Assim, ultrapassada a definição de que as contas devam ser prestadas e quanto à parte que deva cumprir esta obrigação, resta apenas aferir a existência de saldo devedor decorrente da relação jurídica entabulada e a parte que está obrigada a satisfazer aquele montante. 5. Desta forma, existindo saldo em favor da parte autora, esta obrigação foi constituída regularmente, devendo o réu arcar com a satisfação desta. Afastada a preliminar e negado provimento ao apelo.

Apelação Cível Quinta Câmara Cível
Nº 70035335900 Comarca de São Lourenço do Sul
SIDNEY SOUZA MENDES APELANTE
CARLOS BUCHAIM APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em afastar a preliminar e negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (Presidente) e Des. Gelson Rolim Stocker.

Porto Alegre, 26 de janeiro de 2011.

DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO,
Relator.

I-RELATÓRIO
Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (RELATOR)
Trata-se de apelação interposta por SIDNEY SOUZA MENDES nos autos da ação de prestação de contas proposta por CARLOS BUCHAIM.
Na decisão atacada (fls. 717-718) foi julgado procedente o pedido formulado, homologada a prova pericial produzida e declarado o saldo credor em favor do autor no valor de R$ 1.567.629,10.
Em suas razões recursais (fls. 728-732) o demandado renovou os argumentos constantes em contestação. Pleiteou a reforma da decisão.
Argumentou que a decisão que não recebeu a impugnação ao laudo pericial foi revogada, consoante fl. 702 dos autos. Sustentou que a decisão padece de vício ao não analisar toda a questão, postulando o julgamento de improcedência da lide.
Contra-razões às fls. 740-753, em preliminar, o postulante requereu o não conhecimento do recurso, vez que destituído de fundamentos.
Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552 do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.
É o relatório.

II - VOTOS
Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (RELATOR)
Admissibilidade e objeto do recurso
Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da sentença de primeiro grau, versando a causa sobre prestação de contas.
Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível, há interesse e legitimidade para recorrer, este é tempestivo e foi devidamente preparado (fl. 735), inexistindo fato impeditivo do direito recursal, noticiado nos autos.
Assim, verificados os pressupostos legais, conheço do recurso intentado para a análise das questões suscitadas.
Da preliminar de não conhecimento do recurso
No que tange à preliminar de inépcia da apelação interposta, aduzida pela apelada nas contra-razões, sob o argumento de que o apelante não declinou os motivos pelos quais a decisão está sendo impugnada, rejeito a referida prefacial, uma vez que, em que pese a inconsistência dos argumentos, o recorrente demonstrou especificamente a sua inconformidade com a decisão.
Ademais, a simples insubsistência e impertinência dos argumentos não levam ao não conhecimento do recurso, apenas a improcedência da irresignação, de sorte que há motivação recursal, nos termos do artigo 514, II, do Código de Processo Civil, inexistindo razão para o seu não conhecimento. Nesse sentido é o aresto a seguir transcrito:
APELAÇÕES CÍVEIS. SEGUROS. AÇÃO DE COBRANÇA. PLANO DE SAÚDE. PRELIMINAR DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO. REJEITADA. NEGATIVA DE COBERTURA DE ENDOPRÓTESE ESSENCIAL AO ATO CIRÚRGICO. IMPOSSIBILIDADE. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA LEI DOS PLANOS DE SAÚDE. DANO MORAL. NÃO CONFIGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRELIMINAR DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO. A preliminar suscitada de não-conhecimento do recurso, com base no art. 514, II, do CPC, pela parte autora nas contra-razões de apelação, deve ser afastada, tendo em vista que a peça recursal utilizou suas razões de fato e de direito para contrapor os argumentos da sentença, havendo razoáveis fundamentos pedindo a reforma parcial da sentença. Preliminar rejeitada. MÉRITO. Hipótese em que a parte demandada não logrou êxito em demonstrar que tenha sido oportunizada a parte autora a adaptação do contrato à Lei nº 9.656/98, ônus que lhe incumbia. Renovações sucessivas do contrato autorizam a imediata aplicação da referida lei. Há manifesta abusividade na cláusula contratual que prevê a exclusão de materiais ou próteses essenciais ao ato cirúrgico, nos termos do artigo 51 do CDC. Aplicabilidade dos arts. art. 10 e 12, da Lei nº 9.656/98. Precedentes desta Corte. DANO MORAL. NÃO CONFIGURADO. O descontentamento da parte autora quanto à falha na prestação de serviços pela parte ré de negar a cobertura da endoprótese ligada à intervenção cirúrgica é justo, porém, no caso concreto, caracterizado como mero dissabor ou mero desacerto contratual, não podendo ser entendido como dano moral, eis que não violado seus direitos de personalidade. DA IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Os honorários advocatícios são do advogado, não compensáveis e de natureza alimentar, motivo pelo qual afasto a determinação judicial de compensação dos mesmos. PRELIMINAR REJEITADA. APELO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO E APELO DA PARTE RÉ DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70031304934, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em 28/10/2009).
Ainda, conforme razões antes explicitadas, o recurso atendeu aos pressupostos processuais intrínsecos e extrínsecos, impugnando os pontos da sentença que julgou inadequados ao caso concreto.
Mérito do recurso em exame
No caso em exame, entendo que não merece guarida a pretensão da parte apelante, devendo ser mantida a sentença de primeiro grau, pelas razões a seguir alinhadas.
Preambularmente, há que se ressaltar que os fatos trazidos à baila pelo demandado nesta segunda fase da ação de prestação de contas deveriam ter sido alegados em sede de defesa na primeira fase do procedimento. Entretanto, o demandado reprisa os argumentos constantes na contestação da primeira fase do procedimento, matéria esta que restou irremediavelmente preclusa, a teor do que estabelece o art. 473 do Código de Processo Civil.
Por outro lado, a ação de prestação de contas é a via processual própria para se aferir a existência de débito ou de crédito, resultante de determinada relação jurídica, sendo necessário que as contas estejam embasadas em documentos idôneos e apresentadas ao Juízo sob a forma contábil, a teor do que estabelecem os artigos 1.020 e 1.183, ambos do Código Civil. Nesse sentido Hoog1 assevera:
A prestação de contas, de acordo com o CC/2002, art. 1.020, passou a ser sob a forma contábil e não mais mercantil, conforme disposto no art. 1.183 do CC/2002.
Assim, devem ser especificadas as receitas e as despesas, apurando-se a partir daí o saldo devedor, levando-se em conta a atualização monetária, juros e demais elementos, de sorte a que seja apurada a obrigação da parte demandada em prestar as referidas contas.
Releva ponderar, ainda, que a pretensão da parte autora encontra respaldo no artigo 914 do Código de Processo Civil, pois as partes devem prestar contas quanto à sociedade da qual participam, dispondo aquela norma que:
Art. 914. A ação de prestação de contas competirá a quem tiver:
I - o direito de exigi-las;
II - a obrigação de prestá-las.
A respeito do dispositivo processual precitado, é oportuno trazer à baila a lição dos insignes juristas WAMBIER, ALMEIDA e TALAMINI2, a qual se transcreve a seguir:
... A primeira modalidade de ação de prestação de contas, prevista no art. 914, I, é a daquele que tem o direito de exigi-las. Ou seja, quando houver a obrigação de prestar contas, e o obrigado não prestá-las espontaneamente, terá o titular dos bens esse meio para exigir que as contas sejam prestadas.
O procedimento desta ação se divide em duas fases: na primeira, verifica-se a obrigação de prestar contas; na segunda, caso existente a obrigação, analisam-se as contas, em si.
...
A petição inicial deverá conter, além dos requisitos do art. 282, a exata menção à origem da obrigação de prestar contas, se legal ou contratual, pois esta será a abrangência da primeira fase. Por isso, deve a inicial ser instruída com a prova de que o réu teve, ou ainda tem, bens do autor em administração.
Acerca do tema em foco também é importante consignar os ensinamentos de Humberto Theodoro Júnior3 a seguir:
Consiste a prestação de contas no relacionamento e na documentação comprobatória de todas as receitas e de todas as despesas referentes a uma administração de bens, valores ou interesses de outrem, realizada por força da relação jurídica emergente da lei ou do contrato.
Seu objetivo é liquidar dito relacionamento jurídico existente entre as partes no seu aspecto econômico de tal modo que, afinal, se determine, com exatidão, a existência ou não de um saldo fixando, no caso positivo, o seu montante, com efeito de condenação judicial contra a parte que se qualifica como devedora.
Na situação sub judice deveria o réu nesta segunda fase do procedimento da ação de prestação de contas se insurgir contra os cálculos elaborados pela parte postulante ou da perícia realizada para apuração do saldo existente, o que não ocorreu oportunamente.
Registre-se que a impugnação do demandado não restou recebida por intempestiva, e a decisão de fl. 702 recebeu a impugnação do autor, e não a da parte ré.
Releva ponderar, ainda, que ultrapassada a definição de que as contas devam ser prestadas e quanto à parte que deva cumprir esta obrigação, resta apenas aferir a existência de saldo devedor decorrente da relação jurídica entabulada e a parte que está obrigada a satisfazer aquele montante.
Assim, o Magistrado, na origem, dirimiu com acerto a controvérsia, cujos fundamentos lançados na sentença equacionaram adequadamente a lide, os quais se adotam como razão de decidir, transcrevendo-os em parte a seguir de sorte a evitar desnecessária tautologia:
A existência da sociedade entre as partes, bem como o dever da parte demandada de prestar contas ao autor restou reconhecida, por meio da sentença exarada às fls. 43/46.
Outrossim, desconstituída a decisão que julgou a segunda fase do processo de prestação de contas, foi determinada a realização de nova perícia, trabalho este que não foi impugnado por qualquer das partes, havendo que se ter como adequado para a solução da lide.
Nestes termos, tenho que nada mais precisa ser dito para que se julgue procedente a presente ação de prestação de contas, homologados os parâmetros estabelecidos pela prova pericial de fls. 635/674.

Dessa forma, tais circunstâncias, como se verifica, demonstram o direito do autor/apelado em relação à prestação de contas pleiteada, ensejando a confirmação da sentença recorrida, tendo em vista a existência de saldo em favor daquele.
Ademais, apurado o saldo e não havendo qualquer impugnação quanto à forma ou o conteúdo do cálculo de liquidação levado a efeito para tanto, deve a parte demandada satisfazer o montante que se reconhece como devido.

III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de afastar a preliminar e negar provimento ao apelo, mantendo a sentença de primeiro grau em todos os seus provimentos, inclusive no que tange à sucumbência.

Des. Gelson Rolim Stocker (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - Presidente - Apelação Cível nº 70035335900, Comarca de São Lourenço do Sul: "AFASTARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME ."

Julgador(a) de 1º Grau: IVAN FERNANDO DE MEDEIROS CHAVES
1 HOOG, Wilson Alberto Zappa, Resolução de Sociedade & Avaliação do patrimônio na apuração de haveres, 2ª ed., Curitiba; Juruá, 2005, p.53.
2 WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo, Curso Avançado de Processo Civil, vol. 3, 9ª ed., São Paulo: RT, p. 170.
3 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil - Procedimentos Especiais. 3 volume. 38ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 92.

 

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